quarta-feira, 21 de agosto de 2019

JAGUARA - Altemar Domingos : resenha




            Ainda ecoando nossa visita à exposição Super-Heróis do Brasil no shopping Continental, além de termos feito a cobertura do Troféu Angelo Agostini, chegou a vez de escrever a respeito de duas das HQs nacionais mais fascinantes, sensacionais e belas com que já tivemos contato.

            Um dos artistas que tivemos o prazer de conhecer nesses eventos foi Altemar Domingos, o também publicitário e ilustrador. O primeiro título do qual iremos nos ocupar é Jaguara – Guerreira e Soberana, publicada ainda em 2005 pela Via Lettera. Com 128 páginas, traz uma arte belíssima e uma história empolgante, dividida em quatro capítulos:

Verde: Começo
Amarelo: Conhecimento
Azul: Confronto
Branco: Coroação

            Conforme já descrevemos no texto com a cobertura da exposição Super-Heróis do Brasil, Altemar buscou aprender a língua tupi, a fim de inserir corretamente diversas expressões nas falas dos personagens. Além disso, como a leitura da edição comprova, pesquisou muito a respeito da fauna, da flora e do folclore da região amazônica, onde se encontra em sua ficção o imenso Jaguaretama.

            O resultado? Primoroso!

            Na Amazônia, uma expedição liderada pelos militares Roger e Jackson se embranha mais e mais na mata, e a tensão explode quando os guias indígenas demonstram pavor em ir adiante, entrar no desconhecido Jaguaretama e ficar a mercê dos krenakores, os índios gigantes liderados pela legendária Soberana Jaguara.

            Na tribo que domina o Jaguaretama acontece uma cerimônia liderada pelo pajé Tendyberaba. Apelando ao deus Nhanderubussu, eles suplicam que seja concedido a Jaguara o poder de empunhar a Lança de Tupã, artefato mágico e poderoso com o qual, muitos anos antes, foi aprisionado em uma dimensão infernal o demônio Jurupari.

            Entretanto, na prisão mística o demônio recebe seu enviado, o Kurupira, que realizou uma tarefa a mando de seu senhor. Jaguara então precisa enfrentar outro krenakore, Kangatã, que faz pouco dela por ser mulher. Um grande erro, claro. A lança desaparece, e Jaguara precisa ir, junto a alguns de seus mais bravos súditos, recuperar o artefato.


            Eles enfrentam os perigos do Jaguaretama, visitam as ruínas de uma antiga civilização, e ficam frente a frente com feras comandadas por outro enviado de Jurupari: Saci-Aíba! Nem pensem que ele é como o Saci do Sítio-do-Picapau-Amarelo, ou da Vila Abobrinha do Chico Bento. Vejam como ficou o personagem na belíssima arte de Altemar Domingos para descobrirem que se trata na verdade de um demônio poderosíssimo e um adversário temível.

            A luta contra o monstro transcorre por várias páginas, em sequências de tirar o fôlego e com participação também de Roger e Jackson, portando seu sofisticado equipamento militar. Mas a chegada á aldeia dos krenakores é interrompida pela batalha que se inicia entre estes e os caetés, manipulados por Jurupari que conseguiu escapar de sua prisão. E enquanto a guerra entre as duas tribos acontece com muita ação e sangue, Jaguara tem uma batalha impressionante com o enorme demônio.

            Roger e Jackson, que pensavam em levar vantagem e cumprir sua sórdida missão, se dão muito mal nesse meio tempo. E quando tudo parecia perdido para Jaguara e os krenakores surge Tupã, semideus que tem assuntos não resolvidos com Jurupari. A batalha entre as criaturas é titânica, mas é graças a um pequeno curumim que não está nem aí para o semideus que o dia é salvo, e Jaguara se torna em definitivo a protetora do Jaguaretama.

            Jaguara – Guerreira e Soberana termina com um dicionário das palavras e expressões em Tupi, além de um painel ecológico com os animais retratados em seus quadrinhos. Um material absolutamente primoroso que somente contribui para deixar o livro ainda mais especial. Se fosse vocês corria para comprar os poucos exemplares ainda disponíveis!

            A recém lançada Contos da Jaguara tem quatro histórias, das quais Altemar foi responsável na íntegra por Uma Origem, trama que abre a HQ. Nas demais escreveu a história e foi responsável pelas cores, mas os desenhos ficaram para outros artistas: Aureo Henrique em O Covarde, ton Marx em Iberê, o Corajoso, e Kleber Lira em a Negociação.

            Uma Origem mostra, como já aconteceu em um dos capítulos de Guerreira e Soberana, Jaguara quando menina descobrindo os segredos do Jaguaretama, seu duríssimo treinamento, algumas passagens bem surpreendentes de seu aprendizado, e como o único medo da Soberana é falhar com seu povo e a Natureza. Por sinal, no site oficial da Jaguara, uma versão digital desta história está disponível na íntegra. Mas eu prefiro lê-la no excelente papel de Contos da Jaguara!


            Já O Covarde mostra a heroína enfrentando o índio Kiré, que pretende derrotá-la por não aceitar que uma mulher seja a líder de todos. Para isso ele toma um curumim como refém, o que naturalmente provoca a ira da guerreira. A luta é muito dura, mas Jaguara empunha a Lança de Tupâ por merecimento, e o final não poderia ser outro.

            Iberê, o Corajoso, é um curumim (menino em tupi, para quem ainda não sabe), que resgata um filhote de onça ferido. Iberê não tem o braço direito, mas isso não o intimida diante dos índios que feriram o bichinho, que querem usar sua pele como ornamento. Iberê insiste e os índios o ameaçam, quando chega Jaguara. A luta é temível mas rápida, e ela ainda dá uma bronca em Iberê, para depois acrescentar que outros poderiam ter a coragem dele. A Negociação, finalmente, mostra a Soberana fazendo diplomacia na tribo dos kaypós, e os chefes destes cometem a imprudência de fazer pouco dela por ser mulher. Mais um desafio que Jaguara vence, e a Soberana ainda medita sobre quantos mais terá pela frente.

            As duas edições estão tranquilamente entre os melhores quadrinhos nacionais que tive a satisfação de ler, com artes belíssimas e histórias empolgantes, que falam da cultura indígena e são protagonizadas por uma mulher incrível, forte e independente. Não poderia haver material mais adequado para nossa época, não é mesmo?

            Por cima, no site oficial, Altemar publicou belíssimas artes de outros personagens, incluindo o Mapinguari e a Mula-sem-Cabeça. Lembrando que Contos da Jaguara tem o número 1 na capa, isso só me faz ter ainda mais ansiedade pelas histórias que vem por aí!




            Jaguara – Guerreira e Soberana e Contos da Jaguara são duas fantásticas HQs nacionais, mosatrando como nosso riquíssimo folclore e a também riquíssima cultura indígena têm muito a oferecer a nossos quadrinistas e escritores. Os fãs de quadrinhos precisam conhecer essas obras, que com certeza enriquecem qualquer coleção!

            E em breve sei que encontrarei a Soberana Jaguara novamente, pois A Ordem vem aí...

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