Ainda
ecoando nossa visita à exposição Super-Heróis do Brasil no shopping
Continental, além de termos feito a cobertura do Troféu Angelo Agostini, chegou
a vez de escrever a respeito de duas das HQs nacionais mais fascinantes,
sensacionais e belas com que já tivemos contato.
Um
dos artistas que tivemos o prazer de conhecer nesses eventos foi Altemar
Domingos, o também publicitário e ilustrador. O primeiro
título do qual iremos nos ocupar é Jaguara – Guerreira e Soberana, publicada
ainda em 2005 pela Via Lettera. Com 128 páginas, traz uma arte belíssima e uma
história empolgante, dividida em quatro capítulos:
Verde: Começo
Amarelo: Conhecimento
Azul: Confronto
Branco: Coroação
Conforme
já descrevemos no texto com a cobertura da exposição Super-Heróis do Brasil,
Altemar buscou aprender a língua tupi, a fim de inserir corretamente diversas
expressões nas falas dos personagens. Além disso, como a leitura da edição
comprova, pesquisou muito a respeito da fauna, da flora e do folclore da região
amazônica, onde se encontra em sua ficção o imenso Jaguaretama.
O
resultado? Primoroso!
Na
Amazônia, uma expedição liderada pelos militares Roger e Jackson se embranha
mais e mais na mata, e a tensão explode quando os guias indígenas demonstram
pavor em ir adiante, entrar no desconhecido Jaguaretama e ficar a mercê dos
krenakores, os índios gigantes liderados pela legendária Soberana Jaguara.
Na
tribo que domina o Jaguaretama acontece uma cerimônia liderada pelo pajé
Tendyberaba. Apelando ao deus Nhanderubussu, eles suplicam que seja concedido a
Jaguara o poder de empunhar a Lança de Tupã, artefato mágico e poderoso com o
qual, muitos anos antes, foi aprisionado em uma dimensão infernal o demônio
Jurupari.
Entretanto,
na prisão mística o demônio recebe seu enviado, o Kurupira, que realizou uma
tarefa a mando de seu senhor. Jaguara então precisa enfrentar outro krenakore,
Kangatã, que faz pouco dela por ser mulher. Um grande erro, claro. A lança
desaparece, e Jaguara precisa ir, junto a alguns de seus mais bravos súditos,
recuperar o artefato.
Eles
enfrentam os perigos do Jaguaretama, visitam as ruínas de uma antiga
civilização, e ficam frente a frente com feras comandadas por outro enviado de
Jurupari: Saci-Aíba! Nem pensem que ele é como o Saci do
Sítio-do-Picapau-Amarelo, ou da Vila Abobrinha do Chico Bento. Vejam como ficou
o personagem na belíssima arte de Altemar Domingos para descobrirem que se
trata na verdade de um demônio poderosíssimo e um adversário temível.
A
luta contra o monstro transcorre por várias páginas, em sequências de tirar o
fôlego e com participação também de Roger e Jackson, portando seu sofisticado
equipamento militar. Mas a chegada á aldeia dos krenakores é interrompida pela
batalha que se inicia entre estes e os caetés, manipulados por Jurupari que
conseguiu escapar de sua prisão. E enquanto a guerra entre as duas tribos
acontece com muita ação e sangue, Jaguara tem uma batalha impressionante com o
enorme demônio.
Roger
e Jackson, que pensavam em levar vantagem e cumprir sua sórdida missão, se dão
muito mal nesse meio tempo. E quando tudo parecia perdido para Jaguara e os
krenakores surge Tupã, semideus que tem assuntos não resolvidos com Jurupari. A
batalha entre as criaturas é titânica, mas é graças a um pequeno curumim que
não está nem aí para o semideus que o dia é salvo, e Jaguara se torna em
definitivo a protetora do Jaguaretama.
Jaguara – Guerreira e Soberana termina
com um dicionário das palavras e expressões em Tupi, além de um painel
ecológico com os animais retratados em seus quadrinhos. Um material
absolutamente primoroso que somente contribui para deixar o livro ainda mais
especial. Se fosse vocês corria para comprar os poucos exemplares ainda
disponíveis!
A
recém lançada Contos da Jaguara tem
quatro histórias, das quais Altemar foi responsável na íntegra por Uma Origem,
trama que abre a HQ. Nas demais escreveu a história e foi responsável pelas
cores, mas os desenhos ficaram para outros artistas: Aureo Henrique em O
Covarde, ton Marx em Iberê, o Corajoso, e Kleber Lira em a Negociação.
Uma
Origem mostra, como já aconteceu em um dos capítulos de Guerreira e Soberana,
Jaguara quando menina descobrindo os segredos do Jaguaretama, seu duríssimo
treinamento, algumas passagens bem surpreendentes de seu aprendizado, e como o
único medo da Soberana é falhar com seu povo e a Natureza. Por sinal, no site
oficial da Jaguara, uma versão digital desta história está disponível na
íntegra. Mas eu prefiro lê-la no excelente papel de Contos da Jaguara!
Já
O Covarde mostra a heroína enfrentando o índio Kiré, que pretende derrotá-la
por não aceitar que uma mulher seja a líder de todos. Para isso ele toma um
curumim como refém, o que naturalmente provoca a ira da guerreira. A luta é
muito dura, mas Jaguara empunha a Lança de Tupâ por merecimento, e o final não
poderia ser outro.
Iberê,
o Corajoso, é um curumim (menino em tupi, para quem ainda não sabe), que resgata
um filhote de onça ferido. Iberê não tem o braço direito, mas isso não o
intimida diante dos índios que feriram o bichinho, que querem usar sua pele
como ornamento. Iberê insiste e os índios o ameaçam, quando chega Jaguara. A
luta é temível mas rápida, e ela ainda dá uma bronca em Iberê, para depois
acrescentar que outros poderiam ter a coragem dele. A Negociação, finalmente,
mostra a Soberana fazendo diplomacia na tribo dos kaypós, e os chefes destes
cometem a imprudência de fazer pouco dela por ser mulher. Mais um desafio que
Jaguara vence, e a Soberana ainda medita sobre quantos mais terá pela frente.
As
duas edições estão tranquilamente entre os melhores quadrinhos nacionais que
tive a satisfação de ler, com artes belíssimas e histórias empolgantes, que
falam da cultura indígena e são protagonizadas por uma mulher incrível, forte e
independente. Não poderia haver material mais adequado para nossa época, não é
mesmo?
Por
cima, no site oficial, Altemar publicou belíssimas artes de outros personagens,
incluindo o Mapinguari e a Mula-sem-Cabeça. Lembrando que Contos da Jaguara tem
o número 1 na capa, isso só me faz ter ainda mais ansiedade pelas histórias que
vem por aí!
Jaguara
– Guerreira e Soberana e Contos da Jaguara são duas fantásticas HQs nacionais,
mosatrando como nosso riquíssimo folclore e a também riquíssima cultura
indígena têm muito a oferecer a nossos quadrinistas e escritores. Os fãs de
quadrinhos precisam conhecer essas obras, que com certeza enriquecem qualquer
coleção!
E
em breve sei que encontrarei a Soberana Jaguara novamente, pois A Ordem vem aí...
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