Os
encadernados lançados pela divisão Disney da Editora Abril têm sido o sonho de
consumo dos fãs de quadrinhos nos últimos anos. Acabamento primoroso, histórias
grandiosas e emocionantes (e ainda estamos devendo a resenha de algumas, como A
Espada de Gelo, Pateta Repórter e maravilhosa A Saga do Tio Patinhas) que não
paramos de ler e reler. O único problema para alguns é o preço, realmente bem
mais elevado que as revistas normais de linha, apesar de realmente valerem cada
centavo. Sabiamente, a Disney tomou então a decisão de lançar uma linha de
revistas inéditas, intermediárias entre os volumes de capa dura e as
publicações normais.
Essa
linha, onde todas as edições são trimestrais, é composta pela Lendas Disney,
Disney Saga, e O Melhor da Disney Brasil. Os primeiros números foram lançados
respectivamente em janeiro, fevereiro e março, e as características comuns a
todas são o preço, R$ 29,90, capa cartonada, excelente acabamento, 192 páginas
e diversos textos extras com comentários, históricos e entrevistas.
A
Lendas Disney nº 1, que nos foi um pouco difícil de encontrar, visto que não
estava disponível em todas as bancas (a distribuição sempre foi excelente, o
que houve?), não poderia ter recebido um tema melhor: Superpato Original! O
alter-ego do Donald, surgido na Itália em 1969 (mesmo ano em que nasci, YES!)
como uma ideia de Elisa Penna, editora-chefe da Topolino, principal HQ da
Disney na Itália, foi inspirado em uma sátira feita sobre outro personagem dos
quadrinhos, o anti-herói Diabolik. Por isso na Itália, como Donald se chama
Paperino, seu alter-ego se chama Paperinik, conforme é explicado em um dos
textos extras da edição. Uma grande surpresa ainda é o fato de o Magirama, o
Manual de Mágicas que faz parte da linha Disney aqui, relançado recentemente
como fac-símile do original dos anos 1970, é na verdade o Manuale di Paperinik,
o Manual do Superpato! Como o Magirama foi lançado aqui em uma época em que a
Abril havia aposentado temporariamente o herói, todas as ilustrações deste
foram alteradas para se tornarem do Donald.
Já
as histórias do volume são as três primeiras HQs do Superpato publicadas no
Brasil, sem cortes, respectivamente Superpato, O Diabólico Vingador; A Fabulosa
Noite do Superpato; e O Museu de Cera. Antes de cada trama há uma ficha com
autores, roteiristas e artistas responsáveis, as edições originais onde a
história saiu na Itália e no Brasil, e informações sobre o contexto da época.
Assim ficamos sabendo que os padrões italianos e norte-americanos, este último
que a Abril seguia aqui, eram diferentes, e as HQs eram remontadas para se
adequar às publicações daqui.
Além
disso, já em O
Diabólico Vingador o Donald, como Superpato, se mostra como
anti-herói ao enfrentar a polícia, e aqueles eram tristes tempos em nosso país,
onde vigorava a censura. Assim vários quadros foram suprimidos, felizmente
restaurados aqui nessa trama, que por sinal também havia sido publicada
completa em Superpato – O Legado, de 2013. Na história Donald recebe por engano
uma correspondência destinada ao eterno inimigo Gastão, e graças a esse fato
toma posse da Vila Rosa, propriedade na periferia de Patópolis. Apesar da
desconfiança dos três sobrinhos ele se dirige para o local, que está em ruínas,
e acaba descobrindo o Diário de Fantomius, anti-herói do começo do século XX
que roubava dos ricos e dava parte do produto do ilícito aos pobres. Donald
descobre vários segredos da Vila Rosa, incluindo o traje de Fantomius, e
inspira-se nele para se tornar o Superpato!
Em A Fabulosa Noite
do Superpato Donald prossegue na construção de seu alter-ego, com o auxílio do
Professor Pardal. É o cientista que instala os equipamentos secretos no 313, o
clássico carro de nosso herói, além de construir o esconderijo no porão da casa
do pato, acessível com o também clássico armário-elevador. Donald revela ao
amigo ser o Superpato, e Pardal prefere tomar um Car-Can, caramelo cancelador
de memória, para não arriscar revelar seus segredos. E, por sinal, os Car-Can
apareceram inúmeras vezes depois, até mesmo na série futurista As Novas
Aventuras, de que falaremos daqui a pouco. A HQ exibe pela primeira vez os
visuais originais de Fantomius e sua companheira, Dolly Páprika, e tem os
elementos clássicos das histórias de nosso herói. Donald é desprezado por
todos, mas aproveita-se desse fato para se vingar como o Superpato. E que bom,
Gastão se dá mal de novo, confesso, nunca gostei do grande inimigo de nosso
pato preferido, alguém que nunca precisou se esforçar para se dar bem.
Falando
em Fantomius, recomendo novamente Superpato – O Legado, edição que traz algumas
das melhores tramas do anti-herói cujo diário deu origem ao Superpato. É muito
divertido ver um personagem como esse na Disney, e além disso muitas de suas
histórias têm sido publicadas na revista mensal do Tio Patinhas. Podem
consultar a respeito, aliás, o Guia dos Quadrinhos, melhor fonte de informações
sobre HQs do Brasil!
Outra
questão importante que quero abordar aqui é o fato de algumas resenhas de
Lendas Disney nº 1 terem saudado o Superpato original, mas criticado aquele das
Novas Aventuras, a versão futurista que tem tramas mais adultas, envolvendo
invasões alienígenas, viagens no tempo e vários outros temas da Ficção Científica.
Essa, devemos dizer, é uma grande dívida que a Abril tem com os fãs da Disney,
pois aqui no Brasil foram publicadas somente 10 de um total de 50 histórias da
série Novas Aventuras, também criada na Itália nos anos 1990. Felizmente as
novas tramas desse universo, apelidadas de Nova Era, têm saído com certa
regularidade por aqui, primeiro na Mega Disney 7, e depois em várias edições da
Disney Big (mas não na mesma ordem de publicação da Topolino italiana),
suprindo um pouco a saudade dos fãs brasileiros. Sobre o universo futurista do
Superpato gostaria de sugerir o artigo que publiquei em meu blog Escritor com R,
Superpato e o Fluxo do Tempo.
Penso
ter conseguido condensar e explicar o universo de Ficção Científica do
Superpato naquele texto, que tem tramas sensacionais e emocionantes, além de
profundas reflexões filosóficas sobre realidades alternativas, inteligência
artificial e muitas outras. E não custa sonhar, lembrando que em 2019 o
Superpato completa 50 anos... quem sabe? Portanto, se consegui alimentar sua
curiosidade a respeito, caro leitor, recomendo que procure em sebos a
maravilhosa As Novas Aventuras do Superpato – A Origem, lançada em 2013 e que
traz os números zero das histórias FC de nosso herói, infelizmente esquecidos
na publicação da série aqui no Brasil nos anos 1990. Garanto que não se
arrependerá, e irá passar a entender muito bem a trama geral desse fabuloso
universo.
Lendas
nº 1 termina com a incrível história O Museu de Cera. Sua publicação no Brasil
se deu em 1978, depois de um longo hiato por parte da Abril, na Tio Patinhas nº
155 (que eu tive, e foi a primeira história do Superpato que li). Ainda eram
tempos de ditadura, e portanto vários trechos foram excluídos da trama, que foi
publicada na íntegra no Brasil somente em Os 80 Anos do Pato Donald
(encadernado de capa dura belíssimo que igualmente recomendamos).
Na
trama, Donald está mais sombrio do que nunca, principalmente quando o Tio
Patinhas se apossa de uma ideia sua para reativar seu combalido museu de cera.
O resultado é péssimo para nosso pato, sobre o qual paira uma intensa pressão
da polícia quando sua identidade secreta fica ameaçada. Donald precisa agir
depressa e com dureza para salvar suas penas, mas no final é bem sucedido, além
de dar uma bela lição no tio avarento e no primo insuportável.
Conhecer
a origem do maior herói da Disney, que depois seguiria uma impressionante
trajetória que o levaria a salvar o mundo e nossa realidade inúmeras vezes
(sim, sou fã de carteirinha das tramas de Ficção Científica de Novas Aventuras
e Nova Era) é um enorme prazer, e até bate uma tristeza ao terminar de ler um
volume tão sensacional e bem produzido. O material extra é primoroso, e depois
de ler Lendas Disney nº 1 penso que poucas pessoas não vão se tornar fãs do
maior herói da Disney, o Superpato! Corra e garanta a sua, que é obrigatória em
qualquer coleção.
~Renato
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